domingo, 28 de abril de 2013

ÁFRICA - O BERÇO DA PAIXÃO


E agora?
Agora é limpar as lágrimas, engolir em seco, aguentar a frustração e esperar que o tempo passe…
Não dizem que ele é um bom aliado para os males do coração?!
Mas...
O pior é conseguir fazer parar o pensamento!
Como se faz isso?!
Dá-se umas cabeçadas na parede,abana-se o cérebro e tudo se esquece?
Se assim fosse…
Todos os desencantamentos amorosos se resolviam facilmente
Sente-se um aperto no peito, o coração oprimido, a alma em frangalhos
E dói dilaceradamente…
Dói sobretudo a renuncia, a certeza de que não se pode voltar atrás, nem no tempo, nem nas palavras…
Juntam-se todos os pedacinhos de cada recordação e reconstitui-se a história:
Recua-se algumas décadas, mais de três, quase quatro…
Tenta-se reunir, na lembrança cada acontecimento vivido naquela época
São momentos únicos de pura nostalgia, puro deslumbramento de uma vivencia feliz numa terra colorida, com os seus cheiros e costumes tão peculiares e tão distantes no tempo e nos quilómetros...
Quem dera poder retroceder
E começar de novo...
Aquele rostinho moreno de menino na flor da idade
 
E ela...
Uma menininha meiga e tímida…
O sol quente, tão quente como só África tem…
O farfalhar das folhas das palmeiras
O caminhar naquele chão de terra vermelha
O murmurar das águas calmas e mornas
A brisa da baía trazendo o cheiro a maresia
Hummm…
Respira-se fundo
Enche-se o peito de ar
E principalmente de alegria de viver
 
De sonhos cor-de-rosa
De uma paixão desmedida pela vida
De amor…
Amor puro de adolescente!
O brotar de um sentimento novo
É assim que a vida tem valor…
O calcorrear as vegetações á beira da baía á procura dos batráquios que se levam para a aula de ciências, onde são dissecados e estudados
A professora é um fenómeno de ideias inovadoras
E as aulas…
Sempre de uma animação impar
Os olhares que se trocam
O toque simples e inesperado das mãos…
O bater apressado do coração
Um tempo tão curto!
Mas ao mesmo tempo…
Um tempo tão preenchido
Que jamais se esquece…
Principalmente porque:
Ele deixou-lhe uma pequena lembrança
Aquela foto...
Que ela guarda anos a fio com especial carinho e sem saber porquê!
Os tempos mudam
E as redes sociais fazem milagres!!
Uma ideia surge...
Porque não procura-lo no FB?!
Basta escrever o nome e um simples clique
E...
Ei-lo!
A primeira impressão:
Meu Deus
Não pode ser...
Nem parece ele!
Mas depois de examinar bem algumas fotos
É ele…
Sem sombra de duvida
É ele!!
Aquele momento nada significa
Assim como não significam os meses seguintes em que se troca uma ou outra palavra…
Ele lembra-se!!
Vivem em países distantes, com vidas tão opostas e com 5 horas de fuso horário diferente, que raramente se conseguem encontrar na net, para uma breve troca de palavras…
Porém…
O destino,
Só pode ser o destino que apronta e desapronta, que começa e termina historias que nunca passarão disso mesmo!!
“Oi boneca…
Estou no Panamá, dentro do avião á espera que descole a caminho de NYC
Se deixares de me lêr
É porque o avião levantou voo”
São minutos esfusiantes, carregados de sentimentos contraditórios, recordações…
A partir daí, começa a troca de emails, as chamadas telefónicas…
A promessa e um reencontro…
E só se vive para isso!
Que se dane todo o resto
Mas…
As mentalidades chocam
Por vezes existem palavras e atitudes
Contraditórias
Incompreensíveis
Que agridem
Magoam
Ferem…
A distância impede o diálogo
Surge o caus
O inconformismo
A insegurança
As cobrança
O desentendimento
O afastamento...
Depois vem a ressaca
O arrependimento...
Ela devia ter sido mais tolerante
Mais paciente
Menos impulsiva
Menos vingativa
Mas não...
Deitou tudo a perder
E agora?!
Que fazer?
nada!!

Dói, dói, dói...
Mas nada do que ela possa fazer ou dizer,remediará alguma coisa!
Pois...ele diz que nada nunca mais mudará nada
É o afastamento total, radical, determinado...
Resta a dura realidade de que faça o que fizer, diga o que disser, ele não voltará a dirigir-lhe a palavra
Uma certeza porém, que teima em não querer aceitar...
Era uma história inacabada e que apenas voltou para por termo a algo que tinha ficado mal resolvido no passado
As histórias reais são assim...
Nem todas terminam bem
E, esta foi apenas mais uma
Mas a esperança, essa... só os anos que estão por vir, a fará esmorecer!

M. C.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

...o que nos devia unir...


…”Nas últimas semanas que passou em Lourenço Marques, Inácio Ribeiro comprou todas as ferramentas que conseguiu. Depois dos acontecimentos de 7 de Setembro de 1974, sabia que não poderia ficar muito mais tempo em Moçambique e recusava-se a deixar lá as poupanças que amealhara à custa de uma vida de trabalho como torneiro mecânico e das rendas de um prédio que construíra na Rua de Portalegre, no bairro da Malhangalene.
 
Levantava dez mil escudos por semana – o máximo permitido – e guardava o dinheiro num cofre escondido debaixo de dois azulejos com fundo falso junto à banheira em vez de o entregar aos cuidados do Consulado de Portugal como fizeram muitos portugueses. Depois de constituir uma reserva, estudou a melhor maneira de levar consigo mais do que os cinco mil escudos regulamentares. Como as notas não lhe valeriam de nada , converteu o dinheiro em objetos para enviar por via marítima e vender na metrópole.
 
O investimento era arriscado porque a Frelimo considerava sabotagem económica retirar de Moçambique automóveis, motos e uma série de outros bens. Se o mandassem abrir os caixotes, teria sarilhos, mas ou arriscava ou ficava sem nada. Disfarçou as cargas proibidas o melhor que pôde: desmantelou uma moto Suzuki vermelha nova e escondeu as peças num contentor; encaixou um faqueiro de prata dentro da porta de um Alfa Romeo Sud pago à última hora e encheu o depósito de combustível com moedas de vinte escudos.

“Descobri que eram feitas de uma liga de prata e trouxe as que consegui. Não andei a vendê-las na rua, mas houve uma casa de penhores que as comprou ao quilo.” Com o resto do dinheiro adquiriu cinquenta caixas de folha de serrote e várias ferramentas de elevada qualidade que dissimulou no meio das mobílias. Deu-se ao trabalho  de desparafusar  a placa de isolamento da porta do frigorifico para esconder os títulos de propriedade do prédio da Rua de Portalegre, na esperança de um dia poder provar que era o dono do imóvel.

Estava preparado para despachar tudo por via marítima e enfrentar as consequências se fosse descoberto quando um conhecido lhe perguntou:



“Senhor Inácio, quer que não abram os seus caixotes?”

O homem explicou-lhe que, por uns trocos, alguns elementos da Frelimo estavam dispostos a fechar os olhos ao que saía do país. E Inácio, como muitos milhares de portugueses a quem foi dada essa oportunidade, nem hesitou.
Cada um transportou o que pôde: na maioria dos casos, carros, motos, algumas mobílias e objetos de estimação. Mas quem tinha jóias ou diamantes fez os possíveis por os levar consigo, sabendo que teriam sempre valor em caso de necessidade…”

 

“Na década de 1970, este era um cenário comum em Portugal, sobretudo nos meios rurais. Em todo o país, apenas 29% das casas tinham, em simultâneo, água canalizada, eletricidade, banheira e retrete; em Lisboa o valor subia para 51%, mas, em Bragança, não passava dos 8%, ficando a maioria das habitações privadas destas condições básicas. No Alentejo, a situação não era muito diferente.”…



In “Os que vieram de África” de Rita Garcia


...quando pedi uma Coca-Cola disseram-me que não havia...
…para os que vieram de África tudo isto significava um atraso que os surpreendeu e criou outro desanimo em relação ao futuro que os esperava…no entanto, considero que o que nos une não é só a saudade da terra que nos viu nascer e crescer…não é só a saudade do contacto estreito, direto e até diário com a natureza esplendorosa…não é só os laços de amizade e fraternidade…o que nos une é também o desprezo com que fomos recebidos nesta terra que diziam ser a nossa Pátria…o que nos une é a forma como fomos violentados…o que nos une é, ainda, a sigla desprezível com que nos marcaram para toda a vida...retornados…eu que nem aqui nasci e cresci…eu que ainda hoje leio no meu cadastro fiscal a informação de Nacionalidade: NÃO PORTUGUÊS.
…para que a nossa memória não seja curta…é tudo isto que nos devia unir…

 

João Neves



 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Os nossos amigos ainda são os de África...




Entre os que vieram de África, há amarguras por resolver.
Nunca perdoaram aos vários Governos o facto do Estado não os ter compensado pelos bens que deixaram em África.
Entre 1976 e 1980, deram entrada no Instituto para a Cooperação Económica (futuro Instituto da Cooperação Portuguesa) quarenta e seis mil pedidos de compensação por perda de imóveis, depósitos e outros pertences abandonados no ultramar.
Essa mágoa é apenas um dos factores que os une.
Hoje, milhares de portugueses que vieram de África alimentam a nostalgia em páginas do Facebook, sites e blogues dedicados às lembranças de outrora.
 É lá que partilham fotografias e histórias, procuram pessoas a quem perderam rasto, marcam almoços anuais para reencontrarem velhos amigos e trazerem o ultramar à Europa.
Separadas as dificuldades do inicio, os “retornados” afirmaram-se no mercado de trabalho nacional e é quase unânime que o seu espírito empreendedor imprimiu um novo dinamismo à economia portuguesa.
Mas para Victor Cerqueira  há uma adaptação que continua por se cumprir.
“Os nossos amigos ainda são os de África, o nosso círculo é o mesmo – o que quer dizer que a integração emocional não ficou completa”.

In “Os que vieram de África” de Rita Garcia.