sábado, 23 de abril de 2016

A CAÇA AO JACARÉ NO MEU LAGO "AMARAMBA"



A CAÇA AO JACARÉ NO MEU LAGO "AMARAMBA"

“…o meu Pai estava de pé no barco a motor com a espingarda...dois berlindes brilhavam nas águas de uma noite escura como bréu e eu enrolada num cobertor ao colo da minha Avó Olímpia:
- Não espirres agora!- disse ela. O meu Pai diz que é imaginação minha, mas eu lembro-me como se fosse ontem...de todos os pormenores!”

O jantar como habitualmente era cedo. Creio que toda a gente em Moçambique, e ainda por mais no mato, jantava quase logo após o pôr do sol. Os mais velhos conversavam um pouco, sabiam o que se passava através do rádio a bateria, enquanto fixavam a fogueira da outra margem: lá estava ela, a luzir em labaredas gigantes como se queria: era o Sr. Raposo a dizer “estou aqui, estou bem!”, a nossa transmitia-lhe exatamente a mesma coisa: tranquilidade. Éramos só nós, os nossos pescadores e famílias. Eu lá ia à minha vidinha brincar com os moleques ao pé das palhotas que estavam em volta do acampamento…até que chegava a hora da ida para a faina. 


Íamos em fila indiana! Um "petromax" iluminava o caminho e creio que havia outro atrás, por causa dos leões, até que chegávamos ao lago. O meu Lago Amaramba!
Os pescadores subiam para o barco, grande, castanho, feito pelo nosso carpinteiro e projetado pelo meu tio João (solteirão habilidoso, inteligente, gostava de Hemingway, também ele exímio pescador de jacarés, mas nunca gostou de mim, nunca assumiu que na família pudesse haver alguém com sangue negro). Eles iam para um lado, para a pesca do campango, do mucupa, do itíla...


A caça ao jacaré era feita a bordo do barco a motor. O meu Pai levava a espingarda, o focador –com o foco de luz- , o remador –com um pau comprido para fazer deslizar o barco quando parava o motor a fim de não afugentar os répteis- e o pescador que levava a fateicha, um pau com um gênero de anzol para puxar o jacaré depois de morto.


A superfície das águas eram exploradas pelo foco de luz. O jacaré apenas era perceptível pelos olhos que brilhavam à luz que serpenteava o lago- apenas eles e as narinas permanecem fora da água-. O tiro era certeiro, bem no meio dos olhos. Depois com a fateicha, puxava-se o jacaré, pegava-se nele- tudo muito rápido, caso contrário ele afunda- e punha-se no barco. Um ou dois por noite. 

No Rio Lugenda sim, a caça era proveitosa, 8 a 10 por caçada! Aí sei que nunca fui. Nem nunca fui à caça no Rio Lúrio.

Os jacarés são répteis bem adaptados ao meio ambiente e dominam bem o seu habitat. Ao contrário do possam pensar o jacaré não é lento, se se sentir ameaçado ou perturbado, ou mesmo se lhe aparecer algum pitéu nos seus momentos de banho de sol à beira do lago ou rio, corre a uma velocidade impressionante. Dentro da água, em caso de ataque, é difícil escapar-lhe e geralmente o fim é trágico; ele é um exímio nadador.


Na manhã seguinte tirava-se a pele para secar, a carne comiam-na os abutres.
O peixe trazido pelos pescadores era aberto e seco com sal...
Eram assim os dias/noites quando ia para o acampamento no Lago Amaramba...
...M-A-R-A-V-I-L-H-O-S-O-S!


Iolanda Ribeiro.