terça-feira, 8 de setembro de 2009

Lena Lamela e Margarida Rebelo Pinto

É por tudo isto que costumo dizer que nós, os Moçambicanos, não somos melhores. "Apenas somos diferentes".
Uma Macua, cheia de orgulho por ter nascido do outro lado do Oceano, num paraíso, chamado Moçambique.

Helena Lamela







Artigo de Margarida Rebelo Pinto
29 de Maio de 2009

Os paraísos servem-nos para esquecer que o resto do mundo existe ou
para nos lembrar que o mundo pode ser um lugar melhor? Depois de uma
semana em Moçambique, onde visitei Maputo e as belas ilhas do Bazaruto
e de Santa Carolina, regressei de África com a sensação de ter
visitado uma outra face da terra.
Por mais filmes que se vejam, mais livros que se leiam, por mais
documentários e notícias que nos passem debaixo dos olhos, África só
pode ser absorvida, entendida e sentida in loco, com as suas cores e
os seus cheiros, a sua beleza e a sua miséria, a sua música e a sua
magia, a sua imensidão e as suas gentes. Foi preciso ir a África para
finalmente perceber a nostalgia incurável, qual malária do coração,
dos que lá nasceram, cresceram ou viveram, e que a descolonização
obrigou a uma partida forçada.
O que mais me tocou em Moçambique foi o povo moçambicano: educado,
afável, tranquilo, feliz. Apesar da miséria, apesar da fome, apesar
das doenças, apesar de tudo. África é um continente sem filtro; tudo
se vive à flor da pele e em carne viva. E tudo é brutal, seja o belo
ou o horrendo. Mas os moçambicanos possuem uma doçura que deve ser só
deles e que me conquistou para sempre. Viajei para lá contente e
regressei feliz. Fui leve e voltei ainda mais leve.
À parte do clássico episódio da intoxicação alimentar, tive uma viagem
de sonho, não só pela beleza de tudo o que vi, pela forma como fui
tratada. Os empregados do Pestana Lodge no Bazaruto já sabiam o meu
nome desde o segundo dia e quando foi preciso tratar da maleita,
fizeram-me canja, maçã cozida e não descansaram enquanto não me viram
outra vez com cores na cara. Ora este tipo de atenção não está
incluído naquilo a que chamamos serviço de luxo. Um calor genuíno
fez-me pensar como nos relacionamos com os outros, independentemente
daquilo que eles nos possam dar em troca. Uma atitude generosa gera
quase sempre generosidade do outro lado. A paz puxa a paz, a bonomia
puxa a bonomia, a empatia gera empatia.
Não sei quando voltarei a África nem sequer se o que lá vivi perdurará
na minha existência, mas tenho a certeza de que aprendi mais do que
penso, de que vi mais do que acredito ter visto e de que guardei mais
do que agora me lembro. O que eu sei é que me ficou na pele aquela
forma de ser e de estar moçambicana, os sorrisos que dão a volta à
cara toda, as músicas entoadas nas carrinhas de caixa aberta que
atravessam a cidade ao fim-de-semana com dezenas de homens e mulheres
a caminho de um casamento, a alegria natural e espontânea que nunca
pode ser fingida nem fabricada. Há muito amor em Moçambique. Muito
amor e muito prazer, apesar da fome, apesar da miséria, apesar de
tudo.